sábado, 30 de agosto de 2008

David Byrne & Brian Eno - Everything That Happens Will Happen Today




A reação inevitável a notícia de nova parceria entre Brian Eno e David Byrne foi o temor. Tenho muitas boas memórias dos três discos dos Talikng Heads que Eno produziu (Remain in Light estaria bem próximo do topo de uma lista minha de discos favoritos) e o anterior My Life in the Bush of Ghosts é uma dessas raras obras de arte que eu evito revisitar porque ela simplesmente me enche de medo. A idéia de Byrne e Eno se reunirem agora parecia receita para um desastre inevitável. Everything That Happens Will Happen Today não é um novo My Life in the Bush of Ghosts (ou Remain in Light ou Fear of Music, etc.), mas está bem distante da reunião cínica que temíamos. Se o disco tem um defeito é que de certa forma tudo nele é por demais previsto numa relação dialética com as parcerias anteriores da dupla, a tal ponto que tenho minhas dúvidas se o disco possa significar grande coisa para quem não seja bem versado na obra pregressa deles. O tom já fica claro na primeira faixa “Home”, espécie de contraponto benigno de “Once in a Lifetime” (apesar de Byrne não resistir a incluir sutis sugestões de que a domesticidade ali descrita seja só fachada). Se My Life ainda soa atualíssimo (e provavelmente vai continuar soando em 2028), Everything That Happens propõe um retorno a um passado muito distante. Mas é preciso compreender que estamos longe de um simples retorno reacionário a alguma pureza musical imaginária, longe disso o disco é bem coerente dentro deste projeto musical e este mergulho no passado vem acompanhado da mesma procura pelo moderno que antes acompanhara o passeio de Byrne e Eno por sons do terceiro mundo. Byrne descreveu o disco como “gospel eletrônico”, e a expressão ajuda a explicar um pouco do que eles estão atrás. A faixa-título em especial é provavelmente o melhor exemplar de flerte entre alguma figura proeminente do rock com música gospel que me lembro. Outros pontos inclui a já mencionada “Home”, a oblíqua “I Feel My Stuff”, “Wanted for Life”, que poderia facilmente estar em qualquer disco dos Talking Heads, e a maravilhosa “Strange Overtones”. Chris Martin deveria processar Eno já que é óbvio que nosso não-músico favorito guardou todas as suas melhores idéias para este disco e a voz do Byrne nunca soou tão boa.

quinta-feira, 28 de agosto de 2008

Em homenagem ao Ruy

Estava hoje ouvindo Zumbi do Mato e resolvi postar aqui o link para a singela homenagem que a banda fez para o Ruy Gardnier: "Rui não sabe nada de cinema"

Falando em Ruy o garoto jáfaz alguns meses está com um segundo blog de música.

quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Um disco por ano

Como o anônimo pediu listas, segue ai um exercício que me propuseram uns tempos atrás, escolher o melhor disco por ano desde que eu nasci.

1981: Mission of Burma - Signals, Calls and Marches

Meio trapaça começar com um EP, mas entre “That’s When I Reach for my Revolver” e “This is Not a Photograph” esta estréia do Mission of Burma é irressistivel. Algumas possíveis alternativas: Red Mecca (Cabaret Voltaire), Dare (The Human League), Heaven Up Here (Echo & The Bunnymen).

1982: Bruce Springsteen – Nebraska

Ao contrário de 81 este me parece um ano bem fraco, o que não diminui o brilho do melhor disco de Springsteen. Mas minha única outra possível opção seria Combat Rock do Clash.

1983: Violent Femmes - Violent Femmes

Um favorito sentimental, não que o tempo tenha reduzido minha apreciação de “Blister in the Sun”, “Kiss Off” ou “Gone Daddy Gone”.

1984: The Replacements - Let It Be

84 curioso cheio de discos 5 estrelas que venderam milhões de cópias (Purple Rain, Born in the USA, Welcome to the Pleasuredome), mas o ponto do ano é mesmo o melhor disco dos Replacements.

1985: The Jesus and Mary Chain – Psychocandy

Durante muitos anos foi meu disco favorito e acho que até hoje nunca recebeu crédito suficiente pela influencia para o bem e para o mal que teve. E ninguém nunca fez distorção soar tão sedutora. Alternativas muito muito distantes: Rain Dogs (Tom Waits), Fear and Whiskey (Mekons), Rum, Sodomy and the Lash (Pogues).

1986: Steve Earle - Guitar Town

Se mais gente ouvisse Guitar Town, Country teria uma reputação muito melhor.

1987: The Cure – Kiss Me, Kiss Me, Kiss Me

87 é um ano curioso onde se eu listar meus 10 albuns favoritos eles viriam acompanhados de um comentário sobre como os artistas invariavelmente fizeram discos mais fortes pouco antes ou pouco depois. Provavelmente o posterior Desintegration é mais coeso, mas Kiss Me, Kiss Me, Kiss Me é o disco que melhor equilibra os interesses do Robert Smith.

1988: Sonic Youth – Daydream Nation

Numa genuína batalha de gigantes Daydream Nation supera por muitíssimo pouco It Takes a Nation of Millions to Hold Us Back, e quem é que escolher qualquer outro disco neste ano é insano ou tem muito mau gosto.

1989/1990: N.W.A. – Straight Outta Compton/Ice Cube – AmeriKKKa’s Most Wanted

E com esta dupla, Ice Cube se torna o único dono de dois primeiros lugares na lista, e em seqüência. O que em retrospecto me deixa ainda mais deprimido a respeito da obra do rapaz na última década. Ainda assim entre estes dois discos se encontram “Straight Outta Compton”, “Fuck the Police”, “Express Yourself”, “Endagered Species”, etc.

1991: My Bloody Valentine - Loveless

Outro destes anos onde o primeiro lugar é inevitável, apesar de que se fosse justo escolhe-lo Star Time, a coletânea em 4 Cds do James Brown seria imbatível.

1992: Pavement – Slanted & Enchanted

Discordo dos fãs xiitas que acham que a banda nunca foi a mesma depois que Stephen Malkmus demitiu o Gary Young, mas este é mesmo o mais charmoso dos discos do Pavement.

1993: Wu-Tang Clan - Enter the Wu-Tang

RZA é um gênio e Method Man estava no auge.

1994: Jeff Buckley - Grace

Ano cheio de obras-primas Crooked Rain, Crooked Rain (Pavement), Parklife (Blur), American Recordings (Johnny Cash), His n’ Hers (Pulp), mas é difícil escolher outro disco.

1995: Pulp - Different Class

Se me pedissem para listar minhas bandas favoritas Pulp certamente estaria próximo ao topo da lista. Eu prefiro por muito pouco This is Hardcore, mas um disco que tem “Common People”, “Disco 2000”, “Sorted for E’s & Wizz” e “Underwear” é perfeito.

1996: Beck – Odelay

Ainda me lembro perfeitamente da tarde de sábado em que a minha mãe me levou até a loja de discos comprar Odelay. Alias, muitas outras alternatives em 96: I Feel Alright (Steve Earle), Pre-Milleniun Tension (Tricky), Emperor Tomato Ketchup (Stereolab), Endtroducing (DJ Shadow), Ironman (Ghostface Killah), Reasonable Doubt (Jay-Z).

1997: Spiritualized - Ladies and Gentlemen We're Floating in Space

Desde a estréia do Spacemen 3, Jason Pierce esteve envolvido em muitos grandes discos, mas nenhum tão brilhante quanto este. Tudo em Ladies and Gentlemen é perfeito do encarte (que mais do que justifica ter uma edição física do disco) a última faixa “Cop Shot Cop”, um épico tão rico e belamente sustentado quanto qualquer um dos lados de Bitches Brew.

1998: Neutral Milk Hotel - In the Aeroplane over the Sea

Elephant 6 lançou muito discos fodas nos anos 90, mas nenhum tão bom quanto este.

1999: The Flaming Lips - The Soft Bulletin

Eu teria gostado do Superman do Brian Singer muito mais se ele tivesse colocado “Waiting for Superman” nos créditos finais. Por sinal, 13 é o quarto disco consecutivo do Blur que bateu na trave na hora que eu montava a lista.

2000: Radiohead - Kid A

Foi dificil escolher entre Kid A, Rated R e Stankonia, mas eu escuto Kid A de ponta a ponta com mais freqüência.

2001: Bob Dylan – “Love & Theft”

Melhor que a grande maioria dos discos clássicos dele. Álbuns que teriam alguma chance num ano normal: The Blueprint (Jay-Z), Let It Come Down (Spiritualized), Is This It (Strokes), Amnesiac (Radiohead).

2002: Wilco - Yankee Hotel Foxtrot

Acho que tenho que agradecer a Warner por tirar Yankee Hotel Foxtrot do caminho do Dylan.

2003: Fountains of Wayne – Welcome Interstate Managers

Vencendo por muito pouco Transatlanticism do Death Cab for Cutie no ano das bandas indie subitamente populares.

2004: Franz Ferdinand - Franz Ferdinand

Ainda em alta rotação aqui em casa.

2005: Art Brut - Bang Bang Rock n'Roll

Eddie Argos sedimentou o primeiro lugar quando decidiu que precisava soltar “I've seen her naked twice!” duas vezes em “Good Weekend”. Algumas alternativas: Be (Common), LCD Soundsystem (LCD Soundsystem), I Am a Bird Now (Antony & the Johnsons), Alligator (The National), The Woods (Sleater-Kinney), Separation Sunday (The Hold Steady).

2006: The Hold Steady - Boys and Girls in America

The Hold Steady poderia facilmente ganhar qualquer um dos anos que lançaram discos (e por sinal vale muito a pena caçar no soulseek os discos do Lifter Puller).

2007: The National – Boxer

James Murphy tem as 3 melhores músicas do ano, mas Boxer é o disco mais redondo. O resto da minha lista dos 10 melhores de 2007 (mais ou menos em ordem): Sound of Silver (LCD Soundsystem), Night Falls Over Kortedala (Jens Lekman), It’s a Bit Complicated (Art Brut), The Reminder (Feist), American Gangster (Jay-Z), In Rainbows (Radiohead), Send Away the Tigers (Manic Street Preachers), Kala (M.I.A.), 8 Diagrams (Wu-Tang Clan), Hissing Fauna, Are You the Destroyer? (Of Montreal).

Pergunta ocasionada pelo disco novo do Verve

Quantas bandas que passaram por longos hiatos voltaram com material novo tão forte quanto seus discos anteriores? Por mais que eu tente só consigo pensar no Mission of Burma.

domingo, 17 de agosto de 2008

Jerry Wexler




Não é surpreendente que a morte de Jerry Wexler tenha tido relativa pouca repercussão, já que não se tratava de um músico, mas a folha de serviços prestados dele é tão extensa quanto à de muitos gênios. O cara produziu Ray Charles nos anos 50, foi instrumental para a carreira de Aretha Franklin nos 60, estava no estúdio quando Wilson Pickett e Salomon Burke gravaram alguns dos seus maiores clássicos, ajudou a tirar a Stax do gueto, etc. Basta dizer que a inteligência e bom gosto de Wexler foram fundamentais para durante uns bons quinze anos entre as décadas de 50 e 60 a Atlantic ter lançado mais música boa que qualquer outra gravadora em qualquer outra época. Mas isto tudo é detalhe, a homenagem aqui fica mesmo por conta dele ter produzido Dusty in Memphis que é só um dos dez melhores álbuns de todos os tempos.

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Musica nova do Franz Ferdinand

A banda disponibilizou no seu site por tempo limitado uma das canções do disco novo. Muito boa.

domingo, 10 de agosto de 2008

Young Marble Giants - Final Day



Como gosto de manter as coisas bem diversas por aqui, nada como contrapor o The Bug com esta maravilha do Young Marble Giants. Existe visão apocaliptica mais delicada que esta?

The Bug - London Zoo




Kevin Martin não é bem um sujeito tranqüilo. Como é de se imaginar de um músico que a certa altura produziu sua trilha sonora alternativa para A Conversação (o excelente Tapping the Conversation) há algo de sufocante no seu trabalho. Basta olhar o título das faixas deste novo álbum do seu projeto The Bug: "Angry", "Murder We", "Too Much Pain", "Insane", etc. Entre Tapping the Conversation e este London Zoo (tenho que correr atrás de Pressure que gravou entre eles), Martin se aprofundou no uso da musica jamaicana de maneira que tanto intensifica a já densa textura da música, mas ao mesmo tempo conserva uma certa acessibilidade que parece estar sempre quase a dar as caras. É impressionante como Martin mantém a tensão ao longo do disco a despeito dos múltiplos vocalistas convidados. O som do Bug segue paranóico e perturbado, se eu fosse responsabilizado por montar uma trilha de um filme de desastre e quisesse garantir que ele mantivesse um tom grave, seria a este London Zoo que iria recorrer. É viciante, mas provavelmente melhor reservado para momentos em que se esteja disposto a mergulhar na atmosfera proposta por Martin.

Fica ai o video de "Poison Dart":

quinta-feira, 7 de agosto de 2008

Links

Simon Reynolds tem um ótimo artigo sobre My Bloody Valentine na última Spin. Nenhuma informação nova, mas o olhar lúcido de sempre.

Aproveitando a crítica do Reynolds do Loveless para o Melody Maker em 91.

Dois belos discos de hip hop



Enquanto toda a atenção da mídia parece ter se voltado para Lil’Wayne, dois belos discos de veteranos foram lançados.

Untitled é chocante, um álbum completamente centrado de Nas. A história já está batida: um disco conceitual a partir dos diferentes significados da palavra “Nigger”, que inclusive teria este título antes de Wall-Mart dizer não (como o próprio Nas descreve no messiânico primeiro single “Hero”). As faixas iniciais não escondem que ele não resiste as possibilidades de um hit mesmo que sacrifique a produção para isso (“Hero” ou “Make the World Go Round”), mas o disco vai crescendo faixa a faixa, com uma transparência conceitual rara. Na altura da divertidíssima “Sly Fox” percebemos que Nas não está simplesmente flertando com polêmica e levando a idéia do álbum muito a sério. Dali em diante é uma faixa clássica atrás da outra começando com “Testify”, das melhores que ele já gravou, em que vai ao analista lidar com síndrome pós-escravidão até a épica conclusão “Black President” (com sampler do Tupac para que não reste duvidas da grandiosidade), passando por pérolas como “Untitled”, “Project Roach” e sobretudo a sublime “Y’All My Niggers”. Que logo antes de Obama dar as caras, Nas faça um rápido desvio pela ficção científica em “We’re not Alone” só confirma que este um dos discos mais inteligentes do ano.

Não dá para recomendar o novo do RZA com tanto entusiasmo, mas é uma pena que o disco tenha passado em branco. Quando criou Bobby Digital, RZA parecia em busca de um projeto de férias. Uma desculpa para curtir um pouco se vestindo de pirata e bancando o super-herói (ao menos, ele chegou lá alguns anos antes de Hollywood). Poderíamos imaginar que Digi Snacks seria mais do mesmo, especialmente ficando pronto alguns meses depois de um álbum estressante e mal recebido do Wu-Tang Clan, mas Bobby mudou, passou pelas mãos de algum roteirista de quadrinhos com síndrome de Alan Moore e se tornou soturno, paranóico, tendo que lidar com o mal que reside dentro dele, etc. Bobby Digital deixou de ser a casa de praia de RZA para se tornar parte essencial do seu projeto de extrair uma poesia grave dos dejetos da cultura pop. O destaque como não podia deixar de ser é a produção cada vez mais rica e variada para o desespero dos puristas. Nenhum filme de super-herói do ano é tão vigoroso, perigoso e envolvente quanto “Good Night”.

quarta-feira, 6 de agosto de 2008

The Hold Steady - Sequestered in Memphis

Como sou um cara lento, demorei umas três audições para perceber que Sequestered in Memphis - uma das melhores canções do Stay Positive, disco novo do Hold Steady - é um interrogatório. Mas é impressionante como Craig Finn faz bom uso da estrutura da música para servir ao arco dramático tanto da própria Sequestered in Memphis, mas também do albúm como um todo. Um desses momentos que reafirmam que Finn é um dos melhores compositores em atividade. Fica ai um vídeo de uma performance recente do Hold Steady no programa do David Letterman:

Blog

Bem, acho que vale a pena fazer uma apresentação.

De tempo em tempo penso em fazer alguma observação ou postar um link no Anotações e depois me lembro que sempre mantive ele exclusivamente sobre cinema, e como sou um cara metódico, termino por desistir de postar lá. Então esperem encontrar por aqui comentários rápidos sobre discos novos e antigos (num formato similar ao do Anotações), sempre que me der vontade de comentar algum, observações mais rasteiras, alguns links e vídeos, etc. Vou tentar fazer ao menos um post por semana como já faço no Anotações, mas já aviso que não estranhem ocasionais silêncios ou se eu passar dois meses só escrevendo sobre jazz.

Fiquei um bom tempo (ok, 15 minutos) tentando pensar num nome para o blog até resolver homenagear minha canção favorita do Modern Lovers. Confesso que os únicos momentos em que me arrependo de não dirigir, é quando preciso ir ao supermercado a noite e penso que não posso descer a Angélica com Jonathan Richman gritando Radio On!.